quinta-feira, junho 30, 2005

Monos

Tudo é obsoleto: os contos dos heróis, a revolução, o sofá na sala, a liberdade, o coração e a teia de aranha no canto do tecto. As histórias dos mártires, de sonhos realizados e de libertadores, são coisas para crianças que ainda não foram à escola, mentiras azul cuéca para crianças imbecís (e andam por aí tantas), as mesmas que deixam os seus papás em frente à TV, enquanto a mãe lhes cose as peúgas.

quarta-feira, junho 29, 2005

Malboro Sarajevo

Estava escondido na prateleira dos livros de 3 cores, há mais de um ano, desde a feira do livro do ano passado, quando cheia de curiosidade visitei a barraquinha da Cavalo de Ferro.

Sim, sou fã da Cavalo de Ferro, talvez pelo poema que vem sempre impresso na última página, ou, mais provavelmente, pelo romantismo do primeiro livro que li desta editora, Ontem.

Hoje li o Malboro Sarajevo e senti as minhas entranhas espremidas e depois de muitas lágrimas escorridas lembrei-me de ontem.

Ontem que foi tão próximo e ao mesmo tempo irremediavelmente perdido (mas não esquecido).

Homenagem

Hoje deitei-me ao lado da minha solidão.
O seu corpo perfeito, linha a linha
derramava-se no meu, e eu sentia
nele o pulsar do meu próprio coração.

Moreno, era a forma das pedras e das luas.
Dentro de mim alguma coisa ardia:
a brancura das palavras maduras
ou o medo de perder quem me perdia.

Hoje deitei-me ao lado da minha solidão
e longamente bebi os horizontes.
E longamente fiquei até sentir
o meu sangue jorrar nas próprias fontes.

Eugénio de Andrade - obra de Eugénio de Andrade Vol 1

Medo

Em vez de identificar-me com a sorte do meu país, identifico este com o meu próprio azar. Aqui, Atlântico, sem consciência alguma da sua existência desde anos atrás. É preciso despertar, entrar no mundo. E desconcertar. O que quer de mim? Sim, o que quer Portugal de nós? Com que direito o exige?

segunda-feira, junho 27, 2005

Regresso, re-visito.

Regresso depois de uma ausência de alguns dias.
Sinto-me estranho. Custa um pouco respirar, tenho a garganta e o peito apertados, a cabeça inchada, como se estivesse embriagado. Auto-diagnóstico: claustrofobia laboral – as paredes estão mais perto do que me lembrava, o tecto mais baixo. É improvável o escritório ter diminuído. Ainda estarei a crescer? Aperto-me entre portas, encaixo-me na minha secretária coberta com o pó da espera. Este espaço é, claramente, muito pequeno. Desculpem, mas não me posso demorar. Lanço um ultimo olhar em redor, para cima, para baixo; na minha cabeça, uma imagem fixa – o caminho até à porta -. Viro-me para a saída, torço o puxador.

Diz-me, plantáste este jardim, este labirinto selvagem, na minha ausência, sem nada me teres dito? Ou terei andado através dele sem me deixar perder?

Posso ficar mais um pouco?

quinta-feira, junho 23, 2005

Um filme sem tradução

Sexta-feira, dia 17, o único dia de folga islâmico, o dia de reza, o dia das eleições presidenciais. Foi o dia mais alucinante desta longa viagem.

Durante as seis horas de viagem pelo deserto escaldante ainda houve tempo para uma breve paragem na aldeia histórica de Naqsh-E Rostam, as casas eram pequenos buracos esculpidos na rocha, num vale verde no meio da planície interminavel, um oasis.

Nesta aldeia a curiosidade dos habitants é imensamente superior à dos visitantes. Em menos de nada vi-me rodeada pelo que parecia ser a população inteira inteira da aldeia, falavam, riam, olhavam, queriam saber coisas! Mas como? Alguns ainda trocavam o habitual salamaleco por hello… (eu tambem só aprendi o salamaleco e nan que é pão).

No destino, Bazm Bavanat, começou o carrocel de emoções. Desta vez os mil olhos pertenciam a um grupo de crianças, freneticamente faladoras a fazerem poses para as fotografias. Uma delas queria oferecer-me um gelado. No meio deste frenezim experimentei uma bebida, tipo água, feita artesanalmente com 40 plantas/flores da montanha. O sabor mais intenso era a rosas com um leve travo Silvestre.

Pouco depois apareceu o guia local, o Abaz, um homem que se orgulha das suas três palavras em inglês e do seu povo. Daí que a lingua não tenha sido impedimento para criar uma mini agência que recebe alguns turistas por ano para visitas no meio das montanhas.

Crianças, apresentações, água Silvestre, chá e apareceram cinco soldados para se juntarem à animação. Seguiu-se uma sessão de pergunta/resposta com tradutor, Mehdi (o motorista, o guia, o contador de histórias). Também os soldados ficaram com curiosidade de saber sobre Portugal, o país que para eles tambem quer dizer côr de laranja.

A conversa estava a ser complicada então fomos, todos juntos, votar.

Timidamente perguntei se poderia tirar uma fotografia a sala de voto e eles fizeram questão que fotografasse TUDO.

A sala de voto tinha um soldado a entrada e uma caixa aparentemente de cartão. A mesa de voto tinha quatro pessoas, duas a verificarem e a carimbarem os passaportes pois não existem listas de eleitores (o controlo é todo feito através dos carimbos e toda a gente pode votar em todo lado). As outras duas pessoas têm um caderno de senhas com uma parte destacável que é o boletim de voto (sem espaço para cruzes, só uma linha para ser escrito o nome do votado). A parte que fica no caderno é a prova de voto, onde o leitor tem de deixar a sua impressão digital.

No meio da confusão até o soldado se ria para a câmera fotográfica, o controlo dos votos era quase nulo e a seriedade eleitoral era agora uma festa de loucos a falar alto e a pedir fotografias.

Por fim, o chefe dos soldados deu o contacto telefónico ao Abaz, just in case...

O pegeot 405 dos anos 80 foi substituído por um jeep, seguramente mais velho, sem suspensão, e lá fomos nós para para os acampamentos nómadas.

A zona nómada fica num vale verde a 2500 m de altitude. Na primeira aldeia nómada, um grupo de crianças estava a fazer pão papel numa chapa de metal, o fogo era alimentado por caganitas de cabra.

As tendas nómadas são feitas de estacas de madeira e lã tingida de negro, numa construção supreendentemente rudimentar. O chão era coberto por tapetes.

Estas sim, sao pessoas pobres, vivem da terra, das ovelhas, dos tapetes que vendem na cidade. Vivem num paraíso e ao mesmo tempo num inferno para sobreviverem.

No meio das 6 ou 7 tendas, dos trajes coloridos dos seus habitantes e da paisagem perfeita, surge um home de fato preto. Na meia hora de conversa só percebi a apalavra UNESCO. A tradução da meia hora de bla bla bla foi: as fotografias tiradas a aldeia devem/têm de ser enviadas para a UNESCO pois esta gente precisa de ajuda!

A segunda aldeia era mais pequena, 3 tendas nómadas e 2 tendas brancas, uma era a escola e a outra era a tenda do professor, um homem que não largava o rádio. Era um homem com um ar campestre, que tinha largado a cidade havia 7 anos, juntamente com a sua mulher, para seguir os nómadas e poder ensinar. E bom encontrar pessoas assim, para elas um sonho não tem limites!

A mulher do professor engraçou logo comigo, pegou-me na mão e levou-me para junto das cabras.

O sol ja se tinha escondido atrás das montanhas e já passava largamente das 19h quando apareceram 2 jeeps, um com soldados e outro com uma mesa de voto ambulante. Uma mota avisava as aldeias mais próximas da chegada dos jeeps.

A minha nova amiga apressou-se a segurar-me na mao, aquela textura já se estava a tornar algo familiar. As pinturas nómadas nas palmas das mãos, com sementes de flores vermelhas da montanha davam às mãos uma côr quente que evocava o elemento frio da natureza. Concluindo, tocar numa mão pintada era quase como segurar um reptil de sangue frio.

O acampamento ficou cheio com os habitantes dos acampamentos vizinhos. A minha amiga, a mulher do professor, ainda agarrada à minha mão foi votar no capot do carro de voto. Depois passou o boletim de voto para a minha mão e lá fui eu contribuir para a democracia iraniana, com um voto desconhecido na minha mão e a câmera de filmar do Abaz a registar todos os meus movimentos...

quarta-feira, junho 22, 2005

vida

Estar viva hoje é algo que devo absolutamente ao acaso.Portanto é de louvar cada dia,cada momento, cada segundo do resto da minha vida. Não é que eu me considere religiosa,talvez um pouco chaman (será assim que se escreve?), mas também não ando a atirar pedras para um monte de calhaus com fitas azuis no topo. O meu templo é sem dúvida a natureza, a minha deusa a lua e a minha oração a contemplação!
O grande acaso foi o ter saído inteira depois de 4000 km,num pegeot 405 nas estradas do Irão. É uma verdadeira batalha andar nestas estradas cheias de camiões pesados com mais de 20 anos. Ninguem liga à sinalética ou regras de trânsito, assumem sempre que não vem nenhum carro em sentido contrário,portanto ultrapassar sem visibilidade é normal. No que eles chamam auto-estradas, os condutores fazem inversão de marcha, param para vender melões ou para lanchar com a família...
Vi tantos carros acidentados e vi um acidente mesmo à minha frente, um carro que vinha em sentido contrário que decidiu virar à esquerda, pela frente encontrou uma mota.
Pormenores à parte, o importante é estar viva antes de morrer.

terça-feira, junho 21, 2005

Ahvaz

Hoje estou em Ahvaz, ainda há pouco estavam 50 graus, o céu deixou de ser azul, os meus olhos estão com metade do tamanho e os lábios com o dobro.

Ahvaz é uma cidade sem nenhum interesse para alem do ar condicionado, fica a 1 hora de caminho do Iraque e a polpulação é uma mistura entre iranianos, iraquianos a árabes.

Fica a meio caminho entre Persepolis, a cidade destruida por Alexandre o grande e Susa onde ficava o antigo palácio de verão do império persa.

Solestício

Solestício com lua cheia, que mistura explosiva. Deve ser um dia muito fértil, fértil de ideias, planos, sonhos, emoções, amor...

É o dia em que faz 3 meses do ano novo iraniano.

Os nossos ciclos deveriam ser os ciclos do sol, com planos, objectivos, desejos. O meu desejo para o próximo ciclo é.... Qual e o vosso?

quinta-feira, junho 16, 2005

Kerman

Uma cidade à beira do deserto, mais perto do Afeganistão e Pakistão, na rota do ópio.

A população mudou completamente, são mais pobres, com o olhar mais pesado. Na habitual visita ao mercado da cidade senti-me desconfortável e reparei que um homem de mala nos seguia... BRRRRRR... Mas isso não me impediu de comprar umas sementes para misturar com o chá preto.

Ontem fui ver um pôr do sol nas montanhas, não resisti em tirar várias fotografias em contra luz. Eu sei que provavelmente o filme ficou queimado, mas não resisti!

Hoje o destino foi Reyan, uma cidadela a 100 km de kerman, e toda feita de lama das montanhas e é uma pequena amostra do que foi Bam (cidade completamente destruida no sismo de 2003).

O próximo destino será o deserto, dois dias de caminhada e a dormir em tendas com a população nómada.

Amanhã é também o dia das eleições. Não percebo muito de marketing político mas parece-me que eles ainda têm muito que aprender, ou será uma questão cultural? As fotografias raramente são de frente, parece que os candidatos estão sempre a olhar para muito longe, não transmitem confiança nem seguranca, só distância.

Comida iraniana

A especialidade e kebab, ou seja, espetadas de carne com arroz basmati. Como fiquei logo enjoada de carnegrelhada comecei a aventurar-me no menu. Frango com nozes e qualquer outra coisa preta. Beringela de todas as formas mas sempre com iogurte. Sopa de especiarias e lentinhas (tambem misturei com iogurte - nao e um costume iraniano).

No primeiro dia comi dizi, no guia vinha a expressao: if you dare... Pois e um genero de cozido a portuguesa feito em sopa de tomate, o caldo e bebido e a carne amassada com um pilao. A pasta fica com um sabor unico, vale pela experiencia.

Porque a hora da refeicao tambem e uma experiencia social, ja comi pizza duas vezes. Os iranianos sao doidos por pizza e eu tambem gosto desta pizza, e mesmo diferente.

A minha perdicao e o pao, em todo lado ha padarias com pao sempre a sair, o pao tipo papel, o pao com sementes de flores da montanha, o pao com ervas aromatica, o pao...

E assim vou ficando com curvas mais redontas, aquilo que se pretende esconder por estes lados!

terça-feira, junho 14, 2005

Coisas

Hoje bebi sumo de cenoura com gelado de rosas, comi beringela com iogurte cozido e cortei a franja pela segunda vez desde que sai de Lisboa.

Amanhã o caminho continua para sul, 40 graus, calças, túnica, lenço, meias, tenis... Muitos litros de chá...

E sem dúvida A VIAGEM...

Yazd

É uma cidade fantástica e muito religiosa, todas as mulheres andam de chador (véu preto até aos pés). O meu lenço cor de rosa é um sucesso, umas mulheres riem, outras não conseguem esconder o espanto. Os homens fitam-me de uma forma estranha, sempre nos olhos, ja aprendi a baixar o olhar.

Segundo a UNESCO, Yazd é a cidade mais antiga no mundo, as construções são feitas em tijolos de areia do deserto e lama das montanhas. Chove uma vez por ano e conta-se que na última vez que nevou as pessoas bateram palmas e correram para a rua para apanharem o que julgavam ser flocos de algodão.

Tudo tem cor de areia menos os pequenos oasis caseiros ou públicos e as mesquitas cobertas de azulejos coloridos.

O hotel é um jardim rodeado de quartos. À noite sabe bem olhar as estrelas, num tapete persa cheio de almofadas, ouvir a água da fonte e as rezas cantadas ao longe. Ramalah Ali ba ba.... Ripata la la... Mohammed... Akiteti la la.

Kasham-Yazd Um dia na estrada

Olhamos para as montanhas e ficamos perdidos na imaginacão de histórias que não são nossas, 'o quadro negro', ' o tempo para cavalos bêbados'... A vegetação é quase inexistente, é um deserto de pedra, uma paisagem agressiva que nos entra pelos olhos.

Durante a manhã passamos em Abyaneh uma vila feita de lama no meio da montanha. Como seria de esperar metade das casas estão em ruinas e não é da gerra! É um local cheio de mistério, habitado por velhotes com trajes coloridos e rodeado de montanhas com pequenas grutas (buracos) que eram casas em tempos já esquecidos.

Ainda passamos em Natanz para visitar mais uma mesquita. Aqui cometi o segundo crime, o lenço deslisou e eu nao reparei... Entretanto apareceu um Ali... Nao aconteceu nada...

Tenho um lenço cor de rosa novo

É verdade, é macio e fresco. O que tinha trazido de Lisboa fazia comichão, impedia-me de ouvir bem e fazia barulho quando eu comia.

Posso olhar para todos os lados e toda a gente, menos para a polícia, são maus, já os vi a insultar uma mulher por andar com os tornozelos descobertos (era iraniana).

Teheran é uma cidade caótica, o planeamento urbanístico é uma piada de mau gosto e o trânsito um desafio à nossa inteligência, onde estão 3 faixas eles fazem 4, nos cruzamentos mais vale fechar os olhos...

Os únicos interesses da cidade são os museus e a montanha, mas para quem está num país tão exótico o impulso é de andar na rua a sentir a dinâmica da cidade.

Em Qom, um dos princiapis centros religiosos do país, tive de usar um segundo véu ate aos pés para visitar a grande mesquita.

Em Kasham , o Ramalah do hotel veio para a nossa mesa com duas garrafas de cerveja sem alcool, dissimuladamente misturadas com alcool caseiro muito manhoso. Passados 10 minutos o ramalah estava com os copos a recitar poesia. Foi a minha primeira ilegalidade.

domingo, junho 12, 2005

Ja ca estou

A chegada ao aeroporto foi algo traumatica. Senti imediatamente um destinto cheiro a chamussa! Chamussa no Irao?

Fui logo obrigada a por um lenco na cabeca e no meu primeiro dia de passeio fui educadamente aconselhada a comprar roupa mais comprida e lencos maiores. Sabia ao que vinha, mas agora sinto uma certa revolta...

A cidade e feia e agora vou para o campo.

quinta-feira, junho 09, 2005

É já amanhã

Por esta hora amanhã, já estarei em Paris a fazer escala a caminho de Teheran.

Perdi o entusiasmo, não me apetece ir simplesmente. É a habitual resistência à aventura misturada com a aversão aos costumes islâmicos. Parecia simples, mas agora que se aproximam os dias de 30/40 graus e eu tapada da cabeça aos pés, com um véu, sem poder mostrar os tornozelos, calças só com camisas que tapem as ancas e nos templos o traje terá de ser completo, negro, comprido, largo, quente...

Já estou habituada a esta resistência à partida, amanhã já sei que tudo terá um sabor diferente. Pelo menos desta vez vou dormir em hotéis, com camas... A aventura vai ser enganar a polícia dos costumes.

quarta-feira, junho 08, 2005

Limites


just walk Posted by Hello

O amanhecer, a chuva que espera pelo acordar, a chegada do calor, temos todo o tempo.

Na minha mente, um segredo desfeito. Encontro-te com um começo; a vida – uma circunferência da qual fazia parte e consegui abrir. Estou agora num espaço aberto, a perder de vista, com a forma do desejo e os limites de um sentimento que penso não ter fim.
Há outro céu, ainda mais tranquilo, e outro nascer de sol; algures, uma pequena praia.

Pudesse eu...

Pudesse eu não ter laços nem limites
Ó vida de mil faces transbordantes
Para poder responder aos teus convites
Suspensos na surpresa dos instantes

Sophia de Mello Breyner
(é um poema da minha vida, juntamente com os olhos de isa)

terça-feira, junho 07, 2005

E tu?

gosto da noite e do riso de cinzas.
gosto do deserto, e do acaso da vida.
gosto dos enganos, da sorte e dos encontros inesperados.

5 Músicas para Transpirar

This Mortal Coil – Song to the Siren
Trash Palace – Je t’aime, moi non plus
Elysian Fields – Drunk on dark sublime
Ben Harper – Sexual healing
Archive – Dark Room

segunda-feira, junho 06, 2005

Kitty goes to Figtree


kitty Posted by Hello

Este sábado fui até à Figueira da Foz para uma sessão de dj (dj session, em americano). Como foi? Bem, foi mais ou menos assim... Eu não os entendi e eles não me compreenderam. Todos de acordo, portanto.

Estive a dar ostras a porcos, mas para eles era mesmo ração de bácoro. O que começou por gosto, passou para negócio e acabou num auto de fé. As seis pessoas (para além de mim) que gostaram, deixaram-me com alguma esperança.

Soube tão bem chegar a Lisboa.

A matéria das palavras



Estamos aqui. Interrogamos símbolos persistentes.
É a hora do infinito desacerto-acerto.

O vulto da nossa singularidade viaja por palavras
matéria insensível de um poder esquivo.

Confissões discordantes pavimentam a nossa hesitação.
Há uma embriaguês de luto em nossos actos-chaves.

Aspiramos à alta liberdade
um bem sempre suspenso que nos crucifica.

Cheios de ávidas esperanças sobrevoamos
e depois mergulhamos nessa outra esfera imaginária.

Com arriscada atenção aspiramos à ditosa notícia de uma perfeição
especialista em fracassos.

Estrangeiros sempre
agudamente colhemos os frutos discordantes.


Ana Hatherly

sexta-feira, junho 03, 2005

Hoje

Tens razão, faz sempre um ano, dois anos, dez anos, uma eternidade que nos encontrámos que nos amámos. Mesmo quando não sabíamos já nos amávamos, porque sempre fomos duas metades à procura, à espera do momento, do beijo, do toque, do olhar...

The Cure

I chose an eternity of this
Like falling angels
The world disappeared
Laughing into the fire
Is it always like this?
Flesh and blood and the first kiss
The first colours
The first kiss

http://fiberfib.com/www/grupo.php?sec=3&bot=17&sub=1&lan=es

heart01 Posted by Hello

O amor não é tudo: não é carne nem bebida, nem um tecto contra a chuva; nem uma boia para os homens que se afogam e sobem e afogam-se de novo; o amor não pode encher o pulmão encolhido, nem limpar o sangue.

quinta-feira, junho 02, 2005

O lugar distante

Sonho repetidamente com a viagem: voar como um morcego num túnel que se estreita; conduzir sozinho, sem bagagem.
Importa-me pouco o caminho que tomo, e onde me leva pouco me importa.

quarta-feira, junho 01, 2005

(...)

Não se pode viver sem pensar e não se pode pensar sem palavras. Mas as palavras, quando despojadas da vida são a hemorragia, o esvaziamento da alma.
António Alçada Baptista

Antony and the Johnsons


antony Posted by Hello

Há raros momentos assim: em que percebemos o que andamos cá a fazer, porque nascemos, porque vale a pena acordar toda a semana à mesma hora para apanhar o mesmo metro, descer na mesma estação, comer o mesmo pequeno-almoço e entrar no mesmo escritório onde toca uma rádio sempre sintonizada na mesma estação.

Ontem à noite, caiu um anjo na Aula Magna. Quem lá esteve pode confirmar: Antony não é deste mundo (apenas está cá de passagem). Depois da sua voz, qualquer som nada mais é que ruído.

Que se cale o mundo até que ele volte a cantar! Ouvimos Antony, podemos morrer.