sexta-feira, julho 17, 2009

O minuto seguinte


Edward Hopper - Hotel Room

Soube que tinha acontecido algo irreparável no momento em que um homem me abriu a porta desse quarto de hotel e a vi sentada ao fundo, olhando pela janela de um modo estranho. Quando fui não se passava nada de estranho, ou pelo menos nada fora do habitual, nada que anunciasse o que iria suceder durante a minha ausência. Esta vez, como todas, ela prognosticou que algo correria mal e eu, como sempre, passei ao lado do seu prognóstico; saí da cidade numa quarta-feira, deixei-a pintando de verde as paredes do apartamento e no domingo seguinte, quando regressei, encontrei-a num hotel, a norte da cidade, transformada num ser aterrado e aterrador. Não conseguir saber o que lhe aconteceu durante a minha ausência e se lhe pergunto manda-me à merda; a mulher perdeu-se dentro da sua própria cabeça, faz catorze dias que a procuro; é como se ela habitasse uma realidade paralela, bem perto mas intransponível, como se falasse uma língua estrangeira. A transtornada razão de quem quer regressar a casa e não o consegue, no minuto seguinte nem sequer se lembra de ter tido casa.

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