sexta-feira, abril 29, 2005

Walpurgis



Quando a primavera vence o inverno e as bruxas e demónios saem à rua para fazer a festa.
Noite de paixões e sentimentos selvagens. É já amanhã no último dia de Abril.

Saudações cosmopolitas!

Ergue-te contra o governo, contra deus. Continua irresponsável.
Diz apenas o que nós sabemos e imaginamos.
Os absolutos são coercivos.
A mudança é absoluta e constante.

A propósito de Artaud

O mundo físico está ali. Todas as colunas ganham o seu equilíbrio.
A montanha está viva, o ar está eternamente vivo, os ruídos libertam-se do gelo; do cubo sai a pessoa. Debaixo do gelo, sons espantosos, nus, ascendem e espalham-se atravessando as cúpulas de silêncio, iluminam negras luas.

quinta-feira, abril 28, 2005

Um programa ainda mais indie Independente

A Culturgest de Lisboa exibe até sábado uma Selecção dos filmes realizados no México sobre os rituais dos índios Tarahumaras a partir dos escritos de Antonin Artaud.

"A tragédia em cena já não me basta.
Quero transportá-la para minha vida."

Antonin Artaud

Ausência

Chove esta tarde e não há flores. Há apenas o som da queda, silencioso e distante, como a memória de escalas descendentes em teclas brancas de um piano de brincar.

quarta-feira, abril 27, 2005


João Pedro Pais Posted by Hello

A D. Quixote

Impressão Digital

Os meus olhos são uns olhos,
e é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos,
onde outros, com outros olhos,
nao vêem escolhos nenhuns.

Quem diz escolhos, diz flores!
De tudo o mesmo se diz!
Onde uns vêem luto e dores,
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.

Pelas ruas e estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros gnomos e fadas
num halo resplandecente!!

Inutil seguir vizinhos,
querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos!
Onde Sancho vê moinhos,
D.Quixote vê gigantes.

Vê moinhos? São moinhos!
Vê gigantes? São gigantes!

António Gedeão in "Movimento Perpétuo", 1956

Areia

The Girl from Monday

Adoro estes filmes que retractam um futuro hipotético, quase profético da sociedade moderna. Neste filme, depois de uma revolução, a economia é regida pelo valor de mercado de cada consumidor, este valor é determinado pela actividade sexual. Portanto todas as actividades sexuais têm de ser registadas, justificadas e classificadas e, representam uma melhoria da qualidade de vida e poder de compra!

Os contra-revolucionários, fazem sexo sem registo e lutam pelo livre arbítrio.
No meio deste cenário surge uma extraterrestre, de Monday, à procura de um conterrâneo que faz parte do movimento contra-revolucionário.

A orquestração do Hal Hartley é mais uma vez fenomenal, com os grande planos que focam o olhar, a introspecção das personagens e toda a sequência da acção (onde as cenas de sexo são completamente dissimuladas).

Fica ainda a saudade do Trust...

5 da manhã

Elevo-me acima das núvens até ao espaço puro, intemporal
Respiro entre as palavras que voltam a ser respiração

terça-feira, abril 26, 2005

Henry e Cato

Cada vez que leio um livro da Iris Murdoch sinto um misto de angustia e raiva, fico absolutamente incapacitada de ler seja o que for nos dias seguintes.

Será que também eu fico assombrada pelos seus demónios?

Será que também eu “numa orgia de vontade imaginara que, se conseguisse correr em frente a velocidade suficiente, tudo ficaria bem”?

Ou será que toda esta fúria é justificada por não aceitar a piedade como forma de amor?

A palavra

E a palavra de pedra caiu no meu peito ainda vivo.
Não importa, eu estava pronto. Eu cá me arranjo.
Hoje tenho tanto para fazer: tenho que matar a memória de uma vez por todas,
tenho que tornar a minha alma em pedra, tenho que aprender a viver outra vez.

sexta-feira, abril 22, 2005

Can

A caneta é mais poderosa que a espada,
mas uma caneta apenas pode escrever palavras.

Uma Questão Moral



Ontem foi o grande noite de estreia do Indie Lisboa com o filme "born into brothels", um documentário sobre a vida de um grupo de crianças nos bordeis de Calcutá.
É impossível ficar indiferente ao realismo das imagens, às cores, aos olhares, às fotografias.

É revoltante imaginar o destino destas crianças e pensar que as mães são as grandes cúmplices. Que mães são estas que querem para os filhos a mesma vida triste que elas próprias tiveram, que pressionam as filhas adolescentes a iniciarem-se na “vida”? Será uma questão moral ou cultural?

quinta-feira, abril 21, 2005

Livros de Poesia

Os livros de poesia são como horóscopos, parece que nos dizem algo misterioso sobre cada momento. Adoro abri-los ao acaso e encontrar-me nas palavras de um desconhecido.
Quando me tocam a alma tenho de leva-los para casa. Quando me sinto só procuro a sua companhia.

“Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.”
Álvaro de Campos

Ópio

Devo confessar que fiquei espantado com a notícia de que “técnicos especializados” iriam proceder ao tratamento e manutenção do corpo do Papa.
Mas, se o Papa era de facto um santo, não era suposto o seu corpo ser imune à decomposição daqueles comuns mortais e, como tal, não ser necessário qualquer intervenção que não a divina?

Também não deixam de ser curiosas as semelhanças com o tratamento dado a ícones comunistas de estados totalitários (supostamente o oposto do que o Papa representaria), nomeadamente com Lenin e o seu grandioso masoleu; para mim, são ambos múmias em exibição.

Ópio do povo? Sem dúvida.

E viva o Papa!

Depois de um longo período de descrença e afastamento da igreja católica surge a grande operação de marketing do novo milénio. Já não há paciência para esta onda de manipulação da opinião pública.

“Não sei para onde vou,
- Sei que não vou por aí.”

quarta-feira, abril 20, 2005

Coiote

Mas ele apenas disse que tinhas o direito de perseguir a perfeição:
ele nunca mencionou apanhá-la.
Como aquele coiote, sempre em perseguição do road-runner;
sempre desempacotando a última engenhoca da Acme,
de certeza que vai resultar desta vez e segue, seguro,
para dentro de túneis onde ecoa um comboio que se aproxima.
A pistola rebenta; o rastilho não arde, até o apanhares.
Todos os pés excepto os teus escapam das armadilhas.
Tu esperas, exactamente onde o pedragulho irá cair,
observando ao longe a poeira dos teus sonhos.
E se o apanhares, se alguma vez tu o fizeres,
não irá ser tenro, todo musculo e decepção, e o que farás com o resto da tua vida?

terça-feira, abril 19, 2005

O que é uma Lomo?


Uma figura de estilo ou o estilo da figura?

segunda-feira, abril 18, 2005


pope Posted by Hello

O primeiro

Ena Ena...
Já temos o primeiro post!
E para começar nada como citar o poema que marcou a minha existência:

"Vem por aqui" --- dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom se eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,E
nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
--- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre a minha mãe.

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde,
Por que me repetis: "vem por aqui"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis machados, ferramentas, e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátrias, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios.
Eu tenho a minha Loucura!

Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,Não sei para onde vou,
--- Sei que não vou por aí.

José Régio

Absolute Pope

O 25º aniversário do pontificado do Papa foi celebrado com o aplauso de muitos conservadores.
Houve mesmo quem afirmásse que o Papa merecia o Nobel da Paz.
João Paulo II pegou numa instituição que começava a libertar-se das grilhetas de séculos de curteza de espírito e autocracia e tornou-a no que pode ser descrito como uma instituição totalitária.

Em 1958, João XXIII assumiu o papado. Meses depois pediu um “aggiornamiento,” uma “modernização” da igreja. As missas começaram a ser dadas nas línguas nativas. Aos padres, freiras e leigos era dada maior participação e autoridade. O Papa João convencionou um Concílio no Vaticano que acabou com séculos do que ele chamou de “santo isolamento” incentivando a igreja a participar na luta pela paz e justiça. O Vaticano chamou a esta nova igreja o “Povo de Deus”.
O Papa João XXIII morreu pouco tempo depois da convenção Vaticano II. Mas as reformas que ele iniciou tomaram raiz. Na África do Sul, os católicos desempenhavam um importante papel na resistência ao apartheid. Na América Latina, o fenómeno da ‘teologia da libertação’ levou a igreja até a milhões de pobres agricultores que tinha ignorado durante muito. Na Europa e América do Norte, as velhas hierarquias estavam a ser desafiadas, mas especialmente a hierarquia de género. Justiça e igualdade eram os temas em foco.
Vinte e cinco anos depois, desapareceu tudo.

João Paulo II participou nas reuniões do Concílio do Vaticano em 1960 e opos-se às mudanças. Assim que tomou o lugar quiz anulá-las. Para conseguir este objective, centralizou fortemente os poderes. As suas intervenções fizeram crescer uma oposição generalizada. Em 1989, mais de 300 eminentes teólogos europeus, incluindo alguns romanos, assinaram a Declaração de Colónia, que acusava o papa de “passar por cima e forçar de um modo inadmissível” as suas competências no campo do ensino da doutrina. Acusava-o de nomear bispos por tudo o mundo “sem respeitar as sugestões das igrejas locais e negligenciando os direitos estabelecidos.” Descrevia a retirada pelo Vaticano de teólogos qualificados do ensino, porque não gostava do que diziam, como “uma perigosa intrusão na liberdade de pesquisa e ensino.”
Nos anos 80, o teólogo francês Marie-Dominique Chenu afirma-o directamente. João Paulo regride para um “prototipo da igreja como uma monarquia absoluta.” Tal como os monarcas absolutos, o Papa João Paulo II recusa-se a ouvir o povo. Torna-se ainda mais agressivo. João Paulo II rebusca e amplifica a doutrina da ‘infalibilidade papal’ e beatifica o seu autor, Papa Pio IX.
Quando os bispos católicos mundiais se reuniam em Roma, todos os 5 anos, não era para debaterem entre si mas para receber a palavra do papa, e para serem questionados sobre alturas em que poderão ter sido pouco agressivos na defesa da doutrina da Igreja.
João Paulo II rapidamente criou uma linha contra aqueles que viram no Vaticano II uma abertura para democratizar a Igreja. Dentro da Igreja a sua liderança será lembrada como nada para além de autoritária.
Em 1979, o teólogo católico suiço Hans Kung, cuja licença para ensinar em instituições católicas foi revogada pelo Vaticano, afirmou que o novo papa, “tinha lançado uma estranha batalha contra as mulheres modernas que procuravam um modo de vida contemporâneo.” Desde então, o papa impediu a discussão da ordenação das mulheres. Até nos seus últimos dias o papa continuou a defender os seus arcaicos valores na Igreja. Um esboço recente de uma directiva do Vaticano baniria as raparigas do altar, eliminando assim uma das restantes áreas de participação permitida às mulheres. Os padres apenas podem permitir a ajuda de raparigas na missa se receberem uma autorização especial do bispo. Os padres, segundo o esboço, nunca devem sentir-se obrigados a recrutar raparigas.
Esta directiva também iria proíbir os Católicos Romanos de dançar ou até bater palmas nas suas igrejas. Iria proíbir os padres de citarem outros textos, nos seus sermões, que não os evangelhos.
O papa morreu, mas o seu impacto na Igreja irá continuar por muitos anos, porque serviu-se da sua longa e doentia permanência no trono não apenas para alterar o rumo mas para escolher a dedo aqueles que se tornarão os novos líderes da Igreja. O papa João Paulo II foi bem mais activo que os seus antecessores ao rechear a sede e filiais da Igreja com os seus homens.
Em 15 anos, o seu antecessor Paulo VI nomeou apenas 26 novos cardeais, mas em 25 anos o papa João Paulo II nomeou 226. Criou cerca de 500 santos, mais do que todos os papas dos últimos 4 séculos juntos. O papa João Paulo II nomeou mais de 70% de todos os bispos católicos, e todos excepto 5 dos 135 cardeais que irão escolher o seu sucessor.

Sim, de facto foi um papado com “apêgo extraordinário.” Um fardo que irá ser carregado na Igreja Católica por futuras gerações.