terça-feira, janeiro 31, 2006

Em que lugar e onde?



Desejo-te. Não te falta nem uma pétala, nem um aroma, nem uma sombra.
Estás em mim, leite de lua. Talvez um dia me vejas, numa lampada apagada,
num canto do quarto onde dormes, sou uma mancha, um ponto na parede.
Talvez me reconheças numa hora passada quando te perguntas com o corpo fechado e sem resposta.
Sou uma cicatriz que já não existe, um beijo lavado pelo tempo, um amor que já enterráste.

Em que lugar e onde? Era urgente porque a eternidade acabou-se-nos. Guarda o abraço com que amei a tua cintura.

segunda-feira, janeiro 30, 2006

À Manha



Encolho os ombros, olho para o céu, duas ou três núvens que andam de sobreiro em sobreiro, que desaparecem de seguida por detrás de um monte, em direcção ao sul, o sol esconde-se atrás delas. Amanhã talvez faça menos calor que hoje, o ar seca, as folhas caem, eu caminho, marcado por uma felicidade que não tem definição, nome, classe.
Continuo, como uma figura que não encaixa na cena, que não consta no argumento, mãos nos bolsos, camisa branca enrrugada. Mantenho-me a passo com uma brisa ligeira que trás da terra a recordação da chuva, do céu, da distância e, de ainda mais longe, outras cenas, outras figuras, desde onde se poderia imaginar a cidade como a fronteira mais distante a partir da qual existe outro mundo.


No sábado fui ao teatro S. Luiz ver uma peça fantástica, baseada num livro de José Luiz Peixoto: "À Manhã". Recomendo que não a deixem para o dia a seguir.

http://lazer.publico.clix.pt/artigo.asp?id=144152

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Sampaio admite resposta nuclear contra a Madeira



-Epá, o que é aquilo?

- Era a Madeira, man...

Portugal autoriza-se a usar doravante armas nucleares contra as regiões autónomas que o ameacem com ataques terroristas com verborreia de destruição maciça, anunciou o ainda Presidente Jorge Sampaio, num discurso que define a doutrina de dissuasão nuclear lusitana.
Jorge Sampaio promete doravante a possibilidade de uma resposta “não convencional” em caso de ataque terrorista com verborreia química ou biológica contra o continente.

quinta-feira, janeiro 26, 2006

Ela e Ele



Ela ouvia Queen, ele Kings Of Convinience. Ela via o Forest Gump, ele O Fiel Jardineiro. Ela pediu filetes, ele pato. Ela jantava às 6 da tarde, enquanto ele lanchava. Ela em Budapeste, ele em Lisboa. Ela estava apaixonada por ele, e ele por ela.

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Escrever

Escrever por encomenda não é fácil, os sentimentos e emoções não se convidam, são antes intrusos que nos invadem e abanam. É o olhar de uma criança que nos fita com curiosidade, um desafio inocente que nos perturba. Ou um telefonema inesperado que nos assalta o coração com aquela voz que em tempos sussurrava ao nosso ouvido, Amor. Ou um cheiro. Ah e o cheiro! Os fragmentos de aromas perdidos que me transportam para memórias distantes ou imaginadas com um toque de desejo.

São estes sentimentos e emoções que procuro nas letras de um livro, de um poema ou numa simples frase. É com esta fome de vida que os meus olhos percorrem a tinta impressa feita das lágrimas e raivas, de risos e desejos, de todo um sentir que reflecte e cresce na minha alma.

e. e. cummings

já que sentir é primeiro
quem presta alguma atenção
à sintaxe das coisas
nunca há-de beijar-te por inteiro;

por inteiro ensandecer
enquanto a Primavera está no mundo
o meu sangue aprova,
e beijos são melhor fado
que sabedoria
senhora eu juro por toda a flor. Não chores
- o melhor movimento do meu cérebro vale menos que
o teu palpitar de pálpebras me diz

somos um para o outro: então
ri, reclinada nos meus braços
que a vida não é um parágrafo

E a morte julgo nenhum parêntesis

O este


Não conheço nenhum relato verídico, alguém que se tenha escrito sem a intenção de provocar inveja nos possíveis leitores. Tenho a convicção de que, à medida que avançam as idades e os sexos se vão misturando devido às suas crescentes semelhanças, esses relatos se irão compreender bem melhor.
A psicologia de pessoas como eu será daqui a uns anos um assunto interessante em jantares de quem cá fica, e há-de reconhecer-se que há muito mais gente como eu do que o aceite hoje em dia neste sistema hipócrita.

Apenas chegamos ao nosso próprio ser conduzidos pelo “outro”, nunca por apenas saber. Chegamos a ser nós próprios na medida em que o outro chega a ser ele mesmo, a ser livres na medida em que o outro o chega a ser. A questão da relação humana tem sido o problema central da minha vida.

terça-feira, janeiro 24, 2006

Mão de ternura


18 Janeiro 2006

Geração Ginsberg



Vi grandes mentes afogadas pela loucura, histéricos com fome de droga arrastando-se pelas ruas, negros ao amanhecer procurando uma dose, cabeças de anjos caídos, cães de olhos cavernosos. Abriram os cérebros ao céu. Passaram por universidades com os olhos radiantes e frescos, alucinando. Foram expulsos por escrever obscenidades nas janelas.

Em roupa interior, queimaram papéis oficiais e escutaram o medo do outro lado da parede. Purgaram o corpo, noite após noite, com sonhos, drogas, alcóol, cegueira; ruas de núvens densas e relâmpagos na mente, iluminando palavras parados no tempo, acordar no cemitério da árvore que não morre, debaixo de um qualquer viaduto em frente ao rio, vibrações solares. Falar 70 minutos seguidos desde o rio até a uma zona de letra j, susurrando recordações e traumas, intelecto em amnésia por sete dias e noites de olhos brilhantes, carne arrojada no pavimento.
Deram voltas e voltas na meia-noite pela estação de caminho de ferro perguntando-se onde ir, e foram, sem deixar corações estilhaçados. Fumaram cigarros em carruagens até quintas isoladas na noite de avós. Estudaram Poe, telepatia e cabala; sozinhos nas ruas procurando anjos caídos. Queimaram os seus braços com cigarros protestando contra a névoa narcótica do tabaco do Capitalismo; distribuiram panfletos supercomunistas. Irromperam a chorar em igrejas imaculadas, nus perante os vazios. Permitiram ser penetrados por virtuosos diplomatas; chuparam e foram chupados por marinheiros, carícias de amor Atlântico.

Exigiram juízos acusando a TV de hipnotismo e foram abandonados com a sua loucura às mãos de um estagiário. Em protesto deram uma só volta a uma simbólica mesa de ping pong.
Sonharam com brechas no Espaço Temporal, com uma vida descarnada dos seus corpos.

Idioteque

Sonhei com uma música, estava tudo em movimento como se estivesse numa carruagem de comboio a uma velocidade que eu não compreendia. Um comboio para 2046.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Hugs

Será que vou receber algum abracinho? :D




*HUGS* TOTAL!
give purykura more *HUGS*

Get hugs of your own

sexta-feira, janeiro 20, 2006

NASA lança missão a Plutão



Não fazia nada de especial, nem manteiga nem canhões nem sapatos nem versos, mas tinha jeito para dar música para além do que as pessoas podiam esperar. O seu rosto era infantil... apesar de algumas rugas e dos óculos rectangulares de massa preta suspensos sobre o nariz. Não era doido, mas tinha um pouco de bacardi algo excessivamente bem bebido.

João B.



Não fazia nada de especial, nem manteiga nem canhões nem sapatos nem versos, mas tinha jeito para vender casas acima do que as pessoas podiam pagar. O seu rosto era infantil, apesar da barba mal aparada e dos óculos incrustados na cara. Não era obeso, mas algo excessivamente bem alimentado.

Euromilhões

- Se ganhar o euromilhões dou 500 Euros a cada uma de vocês – disse a mulher grávida às 3 colegas de trabalho, atrás do balcão das carnes frias do supermercado.

- Só 500 Euros? Pelo menos 1000. – protestou uma das colegas que também tinha jogado.

- Não querias mais nada? Não vês que tenho de comprar o enxoval do meu filho? – ficou com um sorriso de sonho e disse mais umas palavras só para a barriga ouvir.

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Contos que Contam



“Porque as palavras contam. Porque as crianças contam. E porque a solidariedade conta.”
(...)
“Ao Adquirir este livro, estará a contribuir com 1 Euro para o Projecto Rua, do IAC – Instituto de Apoio à criança.”

É preciso dizer que o sexto conto é do José Luís Peixoto e fala de um menino que colecciona selos mágicos, de sorrisos, de vida, de ternura?

Ou que o quarto conto é do Jorge Reis-Sá e mistura a nossa realidade conceptual com o mundo inocente e sem limites de uma criança?

terça-feira, janeiro 17, 2006

Hesitação

“O homem no meio da escada hesitava há vários dias entre subir e descer.
Os anos passavam e o homem continuava a hesitar: subo ou desço?
Até que certo dia a escada caiu.”

Gonçalo M. Tavares em “O Senhor Brecht”

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Jerusalém – Gonçalo M. Tavares

Em que deve pensar um homem?
Para onde deve o homem dirigir o seu pensamento?
Para onde deve o homem dirigir o seu pensamento para não ser considerado louco?

sexta-feira, janeiro 13, 2006

Para Ti

I never felt magic crazy as this
I never saw moons knew the meaning of the sea
I never held emotion in the palm of my hand
Or felt sweet breezes in the top of a tree
But now you're here
Brighten my northern sky.

I've been a long time that I'm waiting
Been a long that I'm blown
I've been a long time that I've wandered
Through the people I have known
Oh, if you would and you could
Straighten my new mind's eye.

Would you love me for my money
Would you love me for my head
Would you love me through the winter
Would you love me 'til I'm dead
Oh, if you would and you could
Come blow your horn on high.

I never felt magic crazy as this
I never saw moons knew the meaning of the sea
I never held emotion in the palm of my hand
Or felt sweet breezes in the top of a tree
But now you're here
Brighten my northern sky.

Nick Drake

Nasceu

Com o sol em capricórnio e a lua em caranguejo.

Hoje

Estou doida, histérica, eufórica, contente, ansiosa...
Eu sabia que o Du tinha de ver a lua cheia... Está quase a nascer...

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Vai

Vai depressa. Vai ver o céu, a lua atrevida apareceu antes do anoitecer e o horizonte recebeu-a com uma pincelada de vermelho. O vermelho rosa dos teus lábios quando sorriem todo o nosso sentir.

Pesadelo de Darwin



É um documentário sobre a forma de vida dos pescadores do lago Vitória na Tanzânia. Onde? Na terra dos Safaris! Onde o vírus da Sida condena demasiados destinos e os recursos naturais são explorados por meia dúzia de poderosos.

O mundo está mesmo podre, não existe sentido de justiça. Só posso acreditar que estamos à beira de uma ruptura, estas barbaridades não podem continuar a acontecer. Um mundo onde uns têm tudo e outros não têm nada. Não faz sentido.

quarta-feira, janeiro 11, 2006

Batida

Sabe tão bem ficar com a orelha esquerda contra o algodão do colchão, ouvir o coração bater. O som compassado, o tempo que foge, o momento em que estou sozinha no meu tempo. O corpo como um relógio sem corda, sem prazo de validade, sem garantia.
A batida constante que não me deixa dormir.

terça-feira, janeiro 10, 2006

Pensamento do dia

Tenho feito demasiadas coisas giras mas poucas importantes.

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Os meus 5 melhores de 2005 - Livros

- O Mar o Mar – Iris Murdoch
- Uma casa na escuridão - José Luís Peixoto
- Nem tudo começa com um beijo - Jorge Araújo e Pedro Sousa Pereira
- Se nos encontrarmos de novo – Ana Teresa Pereira
- Biblioteca - Zoran Zivkovic

Os meus 5 melhores de 2005 - Cinema

- Alice
- Ferro 3
- One Million Dollar Baby
- Colisão
- Garden State

Os meus 5 melhores de 2005 - Música

- Antony and the Johnsons – I am a bird now
- Sigur Rós – Takk
- CocoRosie – Noah’s Ark
- Ladytron – Witching hour
- Interpol – Antics (o mais tocado)

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Away we pop!


Os defensores de Fernando M. argumentam que a sua imagem de cubo de gelo é baseada numa mão cheia de acontecimentos misteriosos. A maior parte das vezes, dizem, esses acontecimentos foram resolvidos silenciosamente.
Quem o conhece bem diz que por vezes exerce uma influência tranquila, outras vezes também não.

Há apenas uma certeza em relação às noites do Fernando M.: são sempre uma incógnita. Nem ele sabe como vai ser. Relaxem, deixem a besta soltar-se, respirem fundo, “eu conheço esta!”, mais um Bacardi, calma, pulem, sintam. Descomprimam, esqueçam poses, engates, dancem com os olhos, falem por sorrisos... senhores e senhoras, meninos e ovelhas, é a loucura!

anda tudo dOidO

É a cabeleireira que me quer rapar o cabelo para fazer desenhos, é o outro que diz que ama um homem e não é gay, são as cartas que chegam antes dos telegramas e os olhares que falam sem dizerem o que não há para dizer.

quinta-feira, janeiro 05, 2006

Eyes without a face



Raramente gosto dos meus olhos, este foi um desses momentos raros.

Se eu gostar de mim, sempre é uma pessoa a gostar.

2002

Recordo o frio do amanhecer, os círculos dos insectos sobre os copos imóveis, a possibilidade de um abismo de luz por detrás das janelas, o aroma triste, cáustico.
Pássaros. Atravessam chuvas e países no erro dos ventos. Voltam incompreensíveis sob leis de esquecimento.
Não tenho medo nem esperança. Deste hotel exterior ao destino, vejo uma praia negra.
Agoro olho o mar. Não tenho medo nem esperança. Estou ferido em mulheres, o meu pensamento é só recordação da ira.
Há uma erva cujo nome não se sabe; tem sido assim a minha vida. Atravesso o inverno e volto a casa: roupa húmida esquecida. Os espelhos estão vazios. Amei tudo o que perdi.

2006



Estava frio e a fogueira gemia numa luta inútil contra a escuridão. Não pensei em nada, não fiz planos. Limitei-me a comer uma mão cheia de pinhões e a beber do gargalo de uma garrafa de champanhe doce.

quarta-feira, janeiro 04, 2006

A Odete?



Muitas pessoas continuam a acreditar na propaganda das organizações religiosas extremistas de que a homossexualidade tem apenas a ver com sexo, considerando-a uma mera perversão sexual. A realidade é que a homossexualidade é multidimensional, e é muito mais sobre cortes de cabelo, ténis DKNY, perfumes, chill-out e Madonna do que sobre sexo.

O sexo, num relacionamento gay, é apenas um meio de expressar amor, tal como para os heterosexuais. Ser gay e muito mais profundo do que simplesmente um relacionamento sexual, ser gay faz parte da identidade pessoal. É como ser branco na Cova da Moura. Sim, ser gay é assim tão profundo. Isto é algo que poucos heterosexuais conseguem compreender a menos que vão tomar um café à Brasileira. Não liguem à Odete, ela não sabe o que quer.

Odete

Começou com um prolongado beijo entre dois homens. Um beijo sem emoção, daqueles em que o resultado só poderia ser “então adeus, até a próxima vida”. Cansa-me esta falta de emoção dos filmes nacionais, os diálogos quase teatrais, a desarticulação da banda sonora.

O filme vai num crescendo sem nunca atingir o climax. Várias relações doentias, uma Odete completamente desequilibrada que resultou num filme pouco interessante.

terça-feira, janeiro 03, 2006

Estranha-se

E entranham-se estas relações bloguisticas. Sinto-me próximo de algumas (poucas) pessoas com quem partilho posts e comentários. Será assim tão estranho? Qual a diferença entre isto e as cartas que se escreviam no século passado? Apenas o meio, nada mais. Os sentimentos podem ser igualmente genuínos.

E a distância? O que interessa a distância? Durante a semana (mais ou menos até às 18:36) estou rodeado de pessoas com quem nem o sabor da sopa me apetece partilhar.

No penúltimo dia de 2005, tive o prazer de conhecer dois “companheiros”. A Eterna Lusa começou por se apresentar; depois, juntou-se o Quixote. Que estranho. Uma coisa é escrever (muitas vezes para mim próprio) e colocar o que se escreve no sofa; outra coisa é alguém ir lá e “sentar-se” comigo e com a Pury. Há pessoas para além dos nomes: pessoas que se entranham.

Foi um prazer Eterna Lusa. Foi um prazer Quixote. Soube-me tão bem acabar o ano com uma surpresa assim.

O Fiel Jardineiro

Não posso ver este tipo de filme. Fico revoltada, apetece-me reagir, fazer a diferença. Mas como? Onde está a energia que me tornava aparentemente invencível e ao mesmo tempo me frustrava tanto?

O Fiel Jardineiro é a história de um homem que preferiu viver no seu jardim, longe da realidade podre que o rodeava. Optou por fazer aquilo a maior parte de nós faz quando vira as costas à política, ao que se passa por esse mundo fora. O importante é mesmo ter o jardim bem cuidado, ou ter o carro novo.

Uma história de coragem e amor sem limites. É também uma denúncia, ou uma lembrança do que se passa na nossa sociedade, os jogos de poder, a importância do dinheiro, a insignificância de uma vida humana.

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Ferro 3

Olhares que queimam onde as palavras são mudas.
É a história de um homem que deambula pelas ruas da cidade à procura de uma casa para passar algumas horas, arromba a porta, lava a roupa, arranja o que está estragado e sai, quase sem deixar vestígios. Um dia encontra uma mulher que sofre em silêncio, e em silêncio partem os dois para um aventura sem regras. Descobrem a dor e o amor, partilham o que não se partilha com palavras. O olhar.

A ilusão que se mistura com a realidade. Um poema em forma de filme, delicado, sofrido, sentido, sonhado.